quinta-feira, 11 de março de 2010

Álbuns Conceituais, Mídias Digitais e a Justiça

Esta semana deparei com a notícia de que o Pink Floyd havia entrado com uma ação na Justiça contra a EMI, sua gravadora, devido à venda individual de suas músicas via Internet. Conforme o trecho a seguir, extraído do UOL, a justiça sabiamente deu o ganho da causa ao Pink Floyd.


O juiz da Alta Corte de Londres, Andrew Morritt, aceitou os argumentos da banda de que a gravadora era obrigada por contrato a vender os álbuns na configuração original, e não separados, por considerar que o objetivo da cláusula é "preservar a integridade artística dos álbuns".

E, se pararmos pra pensar, na minha posição de fã do Pink Floyd, concordo com a decisão do juiz. Logo explico meus motivos. Primeiro, vamos nos ater à discussão da circulação das músicas de qualquer artista via internet, sejam elas por meios legais ou ilegais, já previamente tratado neste mesmo blog no primeiro texto publicado em 2010, que pode ser lido aqui. A questão do usuário pagar ou não pagar pela música on line já deixou de ser assunto para ser discutido entre gravadoras e músicos e tomou a forma de um sindicato criado por músicos ingleses. 

Featured Artists Coalition é uma entidade que conforme divulgado, luta pela maior participação dos músicos sobre a definições de como serão distribuídas suas canções via internet, e assegurar assim que eles tenham ganhos proporcionais à quantidade vendida - todo mundo sabe que, quem leva o maior pedaço do bolo são as gravadoras e não os artistas. A FAC é formada por músicos de diversos estilos e, o que mais me chama a atenção é que todos os membros do Radiohead estão presentes na FAC, sendo Ed O'Brien um dos membros diretores, ao lado de Nick Mason (baterista do Pink Floyd), entre alguns outros. Mas o que me deixou mais intrigado é justamente a situação pela qual o Pink Floyd ganhou essa luta na Justiça e o envolvimento do Radiohead. Meus amigos sabem que gosto demais de todas as duas bandas e, muita gente também soube do pioneirismo do Radiohead quando, ao lançar seu mais CD recente (In Rainbows, 2007), o fez de forma independente, após sair de uma grande gravadora, disponibilizando o mesmo para download e na forma de "pague quanto quiser". Ou seja, pessoas pagaram o equivalente a R$ 30,00 para fazer o download, outros, não pagaram nada. 

Esta foi a forma que o Radiohead adotou para divulgar suas músicas também em consciência com o meio  ambiente e a emissão de carbono durante o processo de produção do CD, capas e encartes. E criou uma polêmica no meio artístico: quanto o artista acha que seu trabalho vale, para simplesmente "dar" ele a seus fãs? No entanto, nenhum outro artista que se tem notícia ou relevância no cenário, seguiu estes passos. Mas a discussão foi aberta: a troca de arquivos on line é inevitável. Então, como os artistas podem ter seus ganhos sobre isso? Como as gravadoras irão controlar as vendas ou mesmo a evitar a pirataria?

Então, surge esta ação do Pink Floyd, que não é contra a venda de música on line, mas contra a venda avulsa de suas canções. E, faz todo sentido. Por isso estou escrevendo este texto. Vamos tomar o clássico álbum The Wall como exemplo e nele, está Another Brick In The Wall Pt 2 (é, a música que tem as criancinhas cantando no final...). Entusiastas do estilo, do rock progressivo irão entender que, trata-se de um álbum conceitual, há uma história, uma linha por trás das canções, uma lógica que se constrói ao escutar o disco como um todo. E, se por exemplo, retirarmos "Empty Spaces" do álbum...com o perdão do trocadilho, ficará um espaço vazio no muro que compõe o disco. Enquanto Another Brick In The Wall Pt 2 pode ser vendida separadamente que será facilmente absorvida por ouvidos despreparados, mas e a lógica e raciocínio previamente introduzidos em The Happiest Days Of Our Lives, faixa que a precede, ficam onde? E esse raciocínio não se enquadra somente a álbuns do Pink Floyd, mas a inúmeros outros artistas, inclusive, The Beatles. Estes são donos do catálogo mais rentável da EMI sendo o Pink Floyd dono do segundo catálogo mais rentável, e The Beatles foram os primeiros a lançar um álbum conceitual, ainda na década de 60. Ou seja, estas músicas "soltas" perdem o sentido, o contexto, ou como dito pelo juiz, deve ser preservada a integridade artística dos álbuns. Sentença melhor que esta, impossível.

Com esse pensamento, voltemos ao Radiohead. Há em OK Computer (terceiro álbum deles, 1997), um conceito, mas as faixas não são interligadas, ou não há uma linha de raciocínio como aquelas expostas nos álbuns conceituais mais clássicos, então, aí torna-se (supostamente) aceitável a venda avulsa de faixas, ou então, opta-se por lançar uma coletânea - se é pra tirar as músicas do contexto, que o façam descaradamente e com o intuito de levantar dinheiro, afinal, coletânea atrai o publico em geral, e não os fãs. Mas e aí, a venda de faixas avulsas é justo com o artista? Um álbum tem que ser ouvido do início ao fim, sem pular faixas, porque ali é o fruto da dedicação do artista. Sempre haverá aquela música que se destaca mais, aquela que você irá gostar mais e uma que não fará tanta diferença. Mas um disco, um CD, o que seja, é uma obra de arte. Uma obra tem que ser apreciada como um todo, e não por partes, por isso ouvimos as canções com tanta profundidade. É preciso haver um motivo maior para ela ser cantada, e aquela obra ser admirada pelo conjunto. Ou por acaso, alguém já pensou em comprar somente o sorriso da Mona Lisa? Ou os dedos de Deus e Adão n'A Criação de Adão de Michelângelo? 

Um abraço
aureliomasr






Um comentário:

Unknown disse...

POrra, Marco Aurelio! Mto bom o texto! fiquei pensando em como seria comprar musicas avulsas do Tommy do The Who!!! Sem sentido nenhum!